3ª lista de recomendações do Choosing Wisely Brasil 

A Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial lançou durante o 55º Congresso da entidade, em São Paulo, sua terceira lista de novas recomendações em práticas que envolvem exames de diagnóstico e intervenções em saúde. Desenvolvidas por uma força tarefa de patologistas clínicos, e por estímulo do movimento internacional Choosing Wisely, a ideia é disseminar escolhas mais acertadas que proporcionem melhor desfecho ao paciente.

“A American Board of Internal Medicine Foundation (ABIM Foundation) criou esse movimento há 12 anos para estimular os profissionais da área de saúde e pacientes a conversarem sobre o uso correto e de exames – o que envolve também acertar o momento adequado de solicitá-los – e intervenções, evitando procedimentos desnecessários ou com potencial de dano. Há procedimentos com riscos e alternativas para determinadas condutas”, explica a diretora de Comunicação da SBPC/ML, Dra Annelise Correa Wengerkievicz Lopes.

Um dos coordenadores do Choosing Wisely Brasil, o médico Guilherme Barcellos, intensivista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) destaca que a essência da escolha inteligente reside na avaliação cuidadosa da adoção de tratamentos respaldados por evidências científicas. “Evita-se duplicações de exames ou procedimentos, minimiza-se riscos e prioriza-se a real necessidade visando proporcionar um cuidado ao paciente que seja tanto seguro quanto eficaz”, explica.

A força tarefa da SBPC/ML selecionou 10 recomendações iniciais, que foram então submetidas à votação dos associados da SBPC/ML para escolha da lista final de 5 recomendações. E a redação final das 5 recomendações foi submetida à avaliação de todos os comitês técnicos que compõem a SBPC/ML. Veja abaixo a lista com as 5 novas recomendações:

1 - Não solicite sorologia para Helicobacter pylori
Exames para o diagnóstico de infecção por Helicobacter pylori só devem ser solicitados naquelas situações em que existe indicação de tratamento caso o resultado seja positivo. A avaliação sorológica para determinar a presença ou ausência de infecção por H. pylori não é considerada clinicamente útil. Quando indicado, existem métodos alternativos que demonstram maior utilidade clínica, sensibilidade e especificidade. O American College of Gastroenterology e a American Gastroenterology Association recomendam o teste respiratório da urease e a pesquisa do antígeno fecal como as modalidades de exame preferenciais para infecção ativa por H. pylori, nos casos em que a investigação diagnóstica esteja indicada.

2 - Não repita o exame HbA1c (hemoglobina glicada) em menos de 3 meses em pacientes estáveis
A vida útil da HbA1c é de aproximadamente 90 a 120 dias, e os efeitos completos de uma mudança de comportamento, dieta ou ajustes de medicamentos não serão totalmente apreciados até que toda a HbA1c em circulação seja substituída (aproximadamente 90 dias). Portanto, testes em intervalos de tempo inferiores a 3 meses podem não oferecer um prazo suficiente para avaliar se o objetivo esperado pelo médico foi atingido. A realização de HbA1c em intervalos de 6 meses pode ser recomendada em indivíduos que alcançaram consistentemente as metas glicêmicas.

3 - Não utilize o Tempo de Sangramento para guiar decisões clínicas
O Tempo de Sangramento é um exame antigo, que vem sendo substituído por outros, que avaliam a coagulação de maneira mais confiável. Não foi estabelecida relação entre o Tempo de Sangramento e o risco real de sangramento do paciente. Existem outros exames da coagulação disponíveis para avaliar o risco de sangramento do paciente.

4 - Não solicite Procalcitonina sem um protocolo bem estabelecido, baseado em evidências
A Procalcitonina é um biomarcador que tem sido utilizado para identificar pacientes com certas infecções bacterianas, como por exemplo sepse. O uso apropriado inclui dosagens seriadas (normalmente diárias) em pacientes selecionados (por exemplo, pacientes com febre e infecções graves presumidas, para os quais foi iniciado antimicrobiano). Dessa maneira, ela auxilia na identificação de pacientes de baixo risco com infecções respiratórias que não se beneficiariam de terapia antimicrobiana, e na diferenciação entre contaminantes de hemoculturas (ex.: Staphylococcus coagulase negativos) de infecções verdadeiras. Quando utilizada de maneira apropriada, leva a oportunidades significativas de redução do uso desnecessário de antimicrobianos. A super utilização de agentes antimicrobianos está diretamente relacionada ao desenvolvimento de resistência antimicrobiana, de forma que o uso criterioso destes agentes deve ser garantido. Quando a Procalcitonina é mal utilizada e os algoritmos estabelecidos não são seguidos, o exame perde seu significado, há custo, mas não benefício ao paciente. Estes cenários ocorrem com frequência quando não há um protocolo institucional bem estabelecido e baseado em evidências. É importante que o laboratório e a liderança da unidade de terapia intensiva estabeleçam os protocolos mais apropriados para o contexto local e monitorem o uso adequado do exame.

5 - Não utilize swabs para coleta de amostras para cultura microbiológica em espécimes cirúrgicos
Para a recuperação ideal dos microrganismos, sempre que possível, devem ser enviadas amostras de tecido ou fluidos e secreções coletadas em seringas ou frascos estéreis. Apesar destas recomendações, muitos laboratórios continuam recebendo swabs, mesmo em situações nas quais amostras de tecido ou fluidos e secreções estão disponíveis. Em alguns casos, ambos (tecido e swab) podem ser coletados simultaneamente para cultura. Amostras de swab não são ideais para exames microbiológicos porque, neste cenário, amostras de tecido ou fluidos e secreções têm maior especificidade e são mais propensas a refletir o processo patológico que está sendo investigado e há evidências de que os swabs não oferecem benefícios, aumentando os custos. A eliminação de swabs, sempre que possível, e o envio apenas de tecidos ou fluidos e secreções resolve estes problemas e resulta em um uso mais eficiente dos recursos e do pessoal do laboratório.
American Society for Clinical Pathology: https://www.ascp.org/content/get-involved/choosing-wisely/choosing-wisely-ascp#

 

RELEMBRE - Abaixo, reveja a primeira lista, lançada em 2018:
1 - Não realize Triagem para a deficiência de 25-OH-Vitamina D na população geral
A deficiência de vitamina D é comum em diversas populações, particularmente durante os meses de inverno, com exposição solar limitada. A suplementação de vitamina D e a exposição solar são suficientes para a correção da hipovitaminose D na maioria dos indivíduos saudáveis. O exame é indicado aos pacientes com maior risco para deficiência de vitamina D. Por exemplo, idosos, gestantes, lactantes, pacientes com raquitismo/osteomalacia, osteoporose, pacientes com história de quedas e fraturas, causas secundárias de osteoporose (doenças e medicações), hiperparatiroidismo, doenças inflamatórias, doenças autoimunes, doença renal crônica e síndromes de má-absorção (clínicas ou pós-cirúrgicas).

2 - Não realize Exame de VHS (velocidade de hemossedimentação) para caracterização de um processo inflamatório em pacientes ainda sem um diagnóstico definido
Solicite uma proteína C-reativa (PCR) para detecção de inflamação aguda A PCR apresenta maior sensibilidade e reflete especificamente a fase aguda da inflamação quando comparada ao VHS. A PCR irá se elevar nas primeiras 24 horas da evolução da doença, enquanto a VHS poderá estar normal. Se o fator causal do processo inflamatório for debelado, a PCR retornará ao normal dentro de um dia, enquanto a VHS permanecerá elevada por vários dias até que o excesso de fibrinogênio seja removido do soro.

3 - Não realize Exame genético da APOE como um teste preditivo para a doença de Alzheimer APOE é um gene relacionado à suscetibilidade para a doença de Alzheimer (DA) de início tardio, sendo esta patologia a causa mais comum da demência
A presença isolada de um alelo ε4 não é necessária nem suficiente para o desenvolvimento da DA. O risco relativo conferido pelo alelo ε4 pode ser confundido na presença de outros alelos de risco, sexo, ambiente e, possivelmente, etnia. A genotipagem da APOE para predição de risco de DA tem utilidade clínica limitada e baixo valor preditivo. Esses itens são fornecidos apenas para fins informativos e não se destinam a substituir a consulta com um profissional médico. Os pacientes com perguntas específicas sobre os itens desta lista ou sua situação individual devem consultar seu médico".

4 - Não realize Exames moleculares para pesquisa de HPV de baixo risco tumoral
Não há indicação clínica para a pesquisa de HPV de baixo risco (subtipos de HPV que induzem a formação das verrugas genitais ou alterações celulares de baixo risco no colo do útero), pois a infecção por estes subtipos de HPV não está associada à progressão de doença tumoral e não existe uma terapia específica para esta condição de HPV. As diretrizes indicam a utilização da pesquisa molecular do HPV em pacientes com resultado da colpocitologia oncótica (Papanicolaou) alterado ou em outras indicações clínicas específicas. A presença de subtipos de HPV de alto risco exige uma investigação minuciosa (por exemplo, colposcopia e biópsia).

5 - Não realize Exame para dosagem de mioglobina ou CK-MB no diagnóstico de infarto agudo do miocárdio (IAM)
Ao invés disso, use troponina I ou T. Ao contrário da CK-MB e da mioglobina, a elevação da troponina I ou T é específica para a lesão cardíaca. Após a necrose do músculo cardíaco, a troponina é liberada na circulação antes da CK-MB e até antes que a mioglobina. Aproximadamente 30% dos pacientes com queixa de desconforto torácico em repouso e CK-MB normal serão diagnosticados com IAM, quando avaliados pela dosagem das troponinas. Uma única dosagem de troponina pode estimar a área cardíaca acometida e o nível de gravidade do IAM. A extensa literatura fornece embasamento científico para uso exclusivo da troponina como teste laboratorial no diagnóstico do IAM, em detrimento do CK-MB e outros marcadores.

Confira agora a segunda lista, lançada em 2019:
1 - Evite exames laboratoriais pré-operatórios de rotina, sem indicação clínica, para cirurgias de baixo risco
A maioria dos testes pré-operatórios (comumente hemograma. Tempo de Protrombina, e TTPA, exames bioquímicos e urinálise) realizados em cirurgias eletivas são normais. Achados clínicos ocorrem em menos de 3% dos pacientes testados. Em quase todos os casos, não há eventos adversos relatados quando pacientes estáveis passam por cirurgias eletivas. Os exames pré-operatórios são indicados para pacientes com fatores de risco ou quando os exames podem esclarecer o risco cirúrgico.

2 - Não solicite múltiplos exames na avaliação inicial de pacientes com suspeita de doença tireoidiana. Solicite o Hormônio Tireoestimulante (TSH) e, se anormal, prossiga com avaliação adicional ou tratamento dependendo dos achados
A dosagem de TSH pode detectar doença tireoidiana subclínica em pacientes sem sintomas de disfunção tireoidiana. Uma dosagem de TSH dentro dos valores de referência exclui, na maioria dos casos, doença primária de Tireoide. Se a dosagem de TSH for anormal, confirmar o diagnóstico com avaliação de T4 Livre.

3 - Não realize triagem com CA-125 ou ultrassom, para câncer de ovário, em pacientes de baixo risco do sexo feminino
O CA-125 e o ultrassom em pacientes de baixo risco e assintomáticas, sem diagnóstico de câncer, não reduzem a mortalidade nestes pacientes. Resultados falso-positivos acarretam a realização de exames ou procedimentos desnecessários e possuem riscos de complicações.

4 - Não realize repetição de Carga Viral de Hepatite C em pacientes sem uso de terapia antiviral
Os exames de Hepatite C quantitativos de alta sensibilidade são apropriados para diagnóstico e são parte do acompanhamento da terapia antiviral. Em outras condições, o exame de Carga Viral não modifica o manejo clínico ou desfecho.

5 - Não solicite teste genético para HFE para pacientes sem sobrecarga de ferro evidenciada ou sem histórico familiar de Hemocromatose Hereditária
A maioria dos casos de Hemocromatose Hereditária é devido à herança de mutações no gene HFE. Estas mutações são comuns em indivíduos de ancestralidade Europeia, entretanto apenas uma pequena proporção destes indivíduos desenvolve condições clínicas. Outros fatores genéticos e não genéticos contribuem para este desenvolvimento. A genotipagem do HFE deve ser realizada em pacientes com sobrecarga de Ferro (ex. Saturação de Transferrina > 45%) ou aqueles com história familiar de Hemocromatose Hereditária.

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